slide 4 slide 1 slide 2 slide 3
Postado por admin em 15/mar/2016 -

(publicado no “site” https://www.oabguarulhos.org.br. em 21-06-2006)


Edson Pereira Belo da Silva

Advogado em São Paulo, pós-graduado em direito, professor de cursinhos preparatórios para as carreiras jurídicas, membro da Comissão de Direitos e Prerrogativas da OAB-SP, articulista e palestrante.

 

          Depois da tempestade, a bonança. Esse seria um outro bom momento para, no contexto social, materializarmos essa máxima popular. Mas mesmo após todos esses atos de puro terrorismo ocorridos com a sociedade paulista nos últimos quatro dias (12 a 16 de maio), os quais ganharam repercussão internacional e envergonharam novamente todos brasileiros, provavelmente ainda não obteremos a tranqüilidade que, há muito, almejamos.

          Assim como em situações anteriores, por exemplo, os 111 presos mortos no massacre do Carandiru e a mega-rebelião de presos em fevereiro de 2001, ambos no Estado de São Paulo, além da chacina da Candelária no Rio de Janeiro, o massacre de Eldorado do Carajás no Pará e mais recentemente o “mensalão”, a indignação da sociedade e, sobretudo, o seu clamor por uma rápida solução são justas.

          Entretanto, tais acontecimentos perduram e se desenvolvem, ganhando agora do mundo do crime contornos mais contemporâneos e um retoque globalizado; de maneira que bons tempos ainda não é uma realidade e se depender das nossas políticas sociais e dos políticos atuais…

          Isso significa, em outros termos, que os tempos bonançosos desejados por todos brasileiros mais parece a Odisséia de Dirceu, o qual estava fadado a nunca encontrar o caminho de casa, dado as suas diferenças e arrogância para com os Deuses gregos.

          Quanto mais os fatos criminosos se proliferam, em todos os níveis e de todas as formas, menos é a capacidade de reagir do Estado e de seus agentes, que sempre têm se portado como meros amadores, buscando tudo resolver com políticas partidárias, principalmente.

          Sem querer ser pessimista, senão realista, notamos que desse último evento em foco, o qual foi destaque inclusive no site da rede de notícias aljazeera.net, nada devemos esperar, senão mais um esquecimento das autoridades, que contam agora com a febre da Copa do Mundo na Alemanha, seguida do início da disputa eleitoral.

          O que se viu no Estado de São Paulo foi o mesmo filme de terror exibido por diversas vezes – pelo mesmo canal (facção criminosa ou crime organizado) – e que todos continuam assistindo inertes, por vezes até concorrendo ou participando. A única surpresa percebida, se assim podemos dizer, está na cara de espanto das autoridades estatais, cuja quais não se cansavam de dizer que detinham o controle da situação carcerária e que a dita facção criminosa (PCC) estava morta.

          Não seria nenhum equívoco afirmar que toda essa história contada pelos agentes do governo foi apenas um faz-de-conta. E o mais grave disso é que essa mentira, isto é, essa falsa sensação de segurança, dita repetidas vezes pode mesmo convencer, mas somente aqueles que vivem e se deixam levar pelo o engodo.

          O que se viu no calor dos referidos acontecimentos terroristas foi o oportunismos barato de pré-candidatos, sofismas impressionantes das autoridades do governo, bem como retomam a discussões sobre a pena de morte e a prisão perpétua. Aliás, toda às vezes que fatos semelhantes a esses acontecem os juristas de plantão são logo convocados e nos saem com essas soluções mirabolantes. Os oportunistas nunca mudam seus discursos!!!

          Depois de desencadeado o terror, não encontramos ninguém na Administração Pública que admita suas falhas, pelo contrário, todos se acusam mutuamente e mostram-se perdidos (governos federal e estadual, Secretário, Delegado de Polícia, Comandante da Polícia Militar, Presidentes das Associações Policiais e de Agentes, etc.), bem assim tentam, sem sucesso, encontrar um bode expiatório para justificar suas incompetências gerenciais, elegendo logo para a mídia dois responsáveis por tudo isso: (i) a entrevista reservada do advogado com o cliente preso e (ii) o celular.

          A entrevista reservada entre o advogado e o preso raramente atinge esse caráter reservado, haja vista que os chamados parlatórios (local de entrevista) das unidades prisionais sempre estão com mais de um advogado, por vezes vários, conversando com clientes e com a porta aberta. Em tais unidades carcerárias existe somente uma única sala, sem cadeiras, para todos os advogados entrevistarem seus clientes. Por sua vez, a revista do advogado tem sido rigorosa, como deve ser, aponto até de se pedir para tirar o cinto da calça, o que já é um abuso.

          Dessa forma, não devemos atribuir a responsabilidade ao advogado, que cumpre tão-somente seu papel constitucional. Eventuais desvios deste ou de outro profissional, se comprovado, deve ensejar sanções administrativas e penais severas, sem como isso tolher ou restringir as garantias constitucionais e os direitos do preso no que tange a sua defesa, seja ela no processo de conhecimento ou de execução.

          Quanto ao celular, a nosso ver, soa como irracional a idéia, nascida do ápice da questão de segurança, de se paralisar ou restringir os funcionamentos das antenas de transmissão (herbes) que estejam próximas das unidades prisionais, independentemente de prejudicar a população e o comércio circunvizinhos daquelas cidades que abrigam tais estabelecimentos prisionais. Não é tirando a vida do paciente que o médico vai eliminar a patologia que o atinge, até porque enquanto o ser humano existir ela também existirá.

          Ora, não podemos punir milhões de pessoas indefesas, domiciliadas nos municípios onde estão situadas as aludidas prisões, de usarem os seus celulares – de relevante utilidade nesse momento de terror – só pelo fato de os agentes do Estado reconhecer as suas incapacidades na vigilância, ou seja, de impedir a entrada de aparelhos celulares nas unidades do sistema prisional.

          No ano de 2005 buscou o Governo Federal convencer os cidadãos para dizerem Sim ao desarmamento, renunciando assim ao direito de adquirir arma e munição, a título de se combater a violência crescente, haja vista que ele, Governo, não consegue impedir o tráfico de armas e munições e, muito menos, diminuir os altos índices da insegurança.

          Essa política bolchevista que se buscou adotar e que felizmente fracassou, bem como a idéia de se deixar inoperante por alguns dias ou meses àquelas herbes, em total prejuízo a população e ao comércio, é a autenticação que faltava no atestado de incompetência, corrupção e falta de inteligência dos poderes constituídos para combater o crime. É inacreditável que os criminosos consigam se organizar e o Estado não.

          Só falta agora algum gênio estatal de plantão dizer para mudarmos de Estado ou Região por que não se consegue mais dominar ou vencer a criminalidade!!!

          Importante enfatizar que a sociedade também tem sua cota de responsabilidade, qual seja, a omissão. Ela há muito tempo deixou de cobrar das autoridades governamentais, aceitando tudo pacificamente, com isso adormece o regime democrático e enferruja os Estado de Direito. A coletividade de hoje parece estar reduzida a grupos sociais. São eles que reivindicam na atualidade o que de direito. Cada um cuidando dos seus iguais.

          Vejam, por exemplo, os funcionários da segurança pública. Inexiste uma unidade entre eles. Cada Associação formula a sua pauta de reivindicações e negociam separadamente, nascendo também daí as distorções até então conhecidas.

          A paralisia social é geral. Nem mesmo os intelectuais, escritores, atores, cantores, clérigos, enfim, pessoas com vozes na sociedade, tomam a iniciativa da mobilização pacífica, mas contundente. A inércia dessas pessoas deixa transparecer que elas concordam com tudo que a mídia apresenta e está acontecendo ou todas as suas forças esgotaram-se na luta contra o regime de exceção.

          De um lado, a corrupção escancarada nos poderes constituídos, o que não envergonha mais o povo, tanto que virou motivo de piada. Do outro, a criminalidade está descontrolada e a população em suas residências assustada. E uma das razões de tudo isso é a desigualdade social, a qual se distancia mais e mais da realidade.

          Voltando ao tema. Depois da batalha dos últimos dias – pois essa guerra não tem fim – só resta-nos, como sempre temos feito, sepultar os mortos e lamentar o ocorrido, já que parece que nossos representantes não possuem inteligências para ter se antecipado a tudo isso, bem assim capacidade para protegerem a si mesmo ou a seus iguais. De modo que não devemos esperar muita coisa, salvo se toda sociedade reagir pacificamente, como em outros tempos que deixa saudades.

          Portanto ouviremos, após mais esses atos terroristas perpetrados agora contra a sociedade paulista, os quais também refletem nas demais unidades da federação, os discursos que se perpetuam há décadas, quais sejam: reforma penal para endurecer as penas e restringir direitos dos presos, mais investimento em segurança pública, etc.

Email – [email protected]