1. introdução
O Estatuto da Advocacia, Lei 8.906/1994, legou a Ordem dos Advogados do Brasil – OAB a obrigação de defender as prerrogativas dos advogados. E, para tanto, criou uma personagem legal e institucional para representar os advogados, judicial extrajudicialmente, sobremodo na prevenção e defesa efetiva das prerrogativas, denominando-o de “representante da OAB”. Esse “representante” é, portanto, a figura institucional nomeada ou indicada pela diretoria da OAB para a pratica de um ou mais atos jurídicos, em juízo ou fora dele, de interesse da própria instituição e da classe, sobretudo na prevenção e defesa das prerrogativas advocatícias.
A princípio, todos os eleitos, diretores e conselheiros da OAB, estão obrigados a ser este “representantes”, já que estão legalmente compromissados enquanto durar os seus mandatos. Mas, em regra, a nomeação desse representante tem recaído sobre um dos membros da Comissão de Prerrogativas, quando existente ou instalada, ou de membro de outra comissão de trabalho, ou, ainda, na pessoa de advogado especialista na temática de interesse, mas sem vínculo político com a OAB.
Até a edição da Lei 14.365/2022, o referido representante da ordem atuava basicamente, e de forma significativa, em duas situações específicas (artigo 7.º, inciso IV, e § 6.º, do EAOAB): quando da prisão em flagrante delito do advogado no exercício profissional; e no cumprimento de mandado de busca e apreensão no escritório de Advocacia. Para esses dois casos citados a lei exige-se a presença do “representante da OAB”, sob pena de ilegalidade do ato pratico pela autoridade.
Essas atuações pontuais já exigiam do “representante da OAB” um certo grau de responsabilidade e conhecimento acerca da matéria “prerrogativas advocatícias” (teoria e pratica); contudo, com o aparecimento da Lei 14.365/2022 no cenário jurídico tais prerrogativas foram ampliadas bem como o grau de participação do “representante da OAB”, ante as complexidades que agora ele terá de conhecer para garantir a segurança jurídica do ato, impedir excessos e relatar abusos da autoridade.
2. Breves considerações sobre a função institucional relevante do representante da OAB na defesa das prerrogativas da advocacia
Inicialmente, com o intuito de se evitar interpretações equivocadas entre as expressões “representante da OAB”, 1 “conselheiro” e “diretoria”, 2 todas elas previstas na Lei Federal n.º 8.906/1994 – EAOAB, faz-se necessário esclarecer que a primeira expressão (“representante da OAB”) está estritamente relacionada à pessoa nomeada ou indicada pelo diretor da OAB (no caso, presidente de Subseção, de Seccional ou do Conselho Federal) para, especificamente, promover a defesa das prerrogativas da classe, inclusive ad hoc.
A nomeação do “representante da OAB” recai, via de regra, sobre o membro da sua Comissão de Prerrogativas, que é o braço especializado e qualificado – ao menos presume-se – para a defesa das prerrogativas advocatícias. No entanto, referida nomeação também pode recair sobre membros de outras comissões de trabalho, além de qualquer advogado, ainda que não esteja ligado à política de classe, e de livre escolha da diretoria.
Mas, importante asseverar que os membros da diretoria – presidente, vicepresidente, secretários geral e adjunto e tesoureiro 3 – são os primeiros “representantes da OAB” porque eleitos democraticamente pela classe, assim como os conselheiros seccionais e federais, de modo que ao tomarem posse e fazerem o juramento atraem para si seríssimas responsabilidades legais. Por outras palavras, todos esses advogados eleitos possuem, legalmente, um dever institucional e, portanto, estão obrigados a serem os primeiros a defenderem o Advogado, a Advocacia e a OAB, três relevantes instituições jurídicas recepcionadas pela Constituição Federal de 1988 (artigos 5.º, inciso LXIII, 93, inciso I, 94, caput, 103-B, inciso XII, § 6.º, 130-A, inciso V, § 4.º, e 133). 4
Dessa forma, os advogados eleitos (diretores e conselheiros) são os representantes primeiro da OAB, por lei e pelas suas normativas internas, conforme preceitua, por exemplo, o artigo 15, caput, e parágrafo único, do Regulamento Geral da OAB; 5 todavia, a função de “representante da OAB” também pode ser desempenhada por advogados de comissões temáticas da própria ordem ou indicados apenas para ato determinado.
Aliás, Paulo Lôbo, 6 comentando o Estatuto da Advocacia e da OAB, assevera que o “presidente do Conselho Federal ou da Subseção, ao tomar conhecimento do fato de que tenha violado ou possa violar direitos ou prerrogativas da profissão, deve adotar as providências judiciais e extrajudiciais cabíveis, designando advogado com poderes bastantes e integrando a defesa, como assistente, quando necessário”. No mesmo sentido é a interpretação de Gisela Gondin Ramos, 7 também comentarista do EAOAB.
O “representante da OAB”, portanto, atua literalmente como Advogado institucional, isto é, defensor judicial ou extrajudicial dos interesses da Advocacia e da OAB, sobremaneira em matéria de prerrogativas. No entanto, não se pode confundir o essa modalidade de “representante da OAB” com os “advogados indicados” para integrar o Conselho Nacional de Justiça – CNJ (CF, artigo 103-B, inciso XII, e § 6.º), o Conselho Nacional do Ministério Público – CNMP (CF, artigo 130-A, inciso V, e § 4.º) e o Conselho da Justiça Federal – CJF (Regimento Interno do CJF, artigo 3.º, § 1.º), bem como inúmeros outros conselhos, haja vista a clara distinção nos papeis institucionais por eles desempenhados.
Temos ainda uma terceira categoria de “representante da OAB”, qual seja, aquele nomeado pela ordem para integrar as bancas dos concursos públicos das carreiras jurídicas, na condição de “participante”, exigência do texto constitucional: CF, artigos 93, inciso I, 129, § 3.º, e 132.
Como visto, a Ordem dos Advogados do Brasil pode nomear seu “representante” para (i) defender as prerrogativas institucionais e da Advocacia, (ii) para participar das bancas dos concursos públicos das carreiras jurídicas – notadamente do Poder Judiciário e Funções Essenciais à Justiça – e (iii) para integrar os já mencionados conselhos; contudo, vale ressaltar que todas essas modalidades e funções previstas na respectiva legislação possui um caráter temporário.
3. O “novo representante da OAB” na defesa das prerrogativas da advocacia, após a Lei 14.365/2022
Oportuno, desde logo, asseverar que todas as prerrogativas da Advocacia – assim como àquelas das outras carreiras jurídicas, dos parlamentares e demais agentes públicos –, previstas na legislação pátria, pertencem, exclusivamente, aos cidadãos, e são elas atribuídas constitucionalmente aos advogados para poder se estabelecer a paridade de condições no embate jurídico rotineiro do Estado contra o cidadão e vice e versa. Por meio das prerrogativas da Advocacia, notadamente o cidadão em conflito com a lei ou por ela constrangido, busca-se alcançar determinado equilíbrio de forças (técnicas/intelectuais) entre os oponentes processuais, já que o Estado é sempre o “Titã” no sistema normativo.
A proteção e fiscalização dessas vitais prerrogativas advocatícias, notadamente pelo “representante da OAB”, é fundamental para a sobrevivência do próprio sistema de princípios, direitos e garantias fundamentais, pois são àquelas que garantem o Advogado e o cidadão judicial e extrajudicialmente, daí a necessidade indispensável de se proteger tais prerrogativas.
Com a edição do atual Estatuto da Advocacia e da OAB – Lei n.º 8.906/1994, surge oficialmente a figura institucional e atual do “representante da OAB”, valendo destacar que no anterior Estatuto da OAB 9 tal função era exercida pelo “presidente da seccional” onde foi violada a prerrogativa. Aliás, essa exigência não possuía mínima razoabilidade ante a quantidade de subseções existentes e geridas pelas seccionais, aliado ao grande número de advogados ali inscritos; pelo que foi salutar a criação da figura do “representante da OAB”.
No atual sistema OAB de defesa das suas prerrogativas, a função do seu “representante” é de grande relevância, sobretudo por conta da responsabilidade institucional de ser ele o zelador e defensor das prerrogativas advocatícias, as quais garantem o cidadão e seu Advogado, em juízo e fora dele.
Aliás, uma das principias intervenções do “representante da OAB” – indicado pela diretoria do Conselho Seccional ou da Subseção – nessa sistemática defensiva, é acompanhar e atuar na lavratura do auto de prisão em flagrante do Advogado preso em decorrência do exercício da função constitucional, sob pena de nulidade, como previsto no artigo 7.º, inciso IV, da Lei 8.906/1994. Nesse passo, para que a referida prisão goze de validade a lei exige que o ato seja comunicado à OAB e que o seu “representante” ali esteja presente; ou seja, a representatividade institucional da OAB nessa modalidade de prisão flagrancial é requisito processual indispensável para que a prisão se torne válida.
Portanto, a autoridade competente tem o dever de provar que fez a devida comunicação à OAB desse fato, sempre que a prisão do Advogado decorrer do seu exercício profissional. E, nesse caso, oportuno mencionar que a presença do “representante da OAB” não é um mero “simbolismo”, na medida em que está ele obrigado pelo Estatuto da Advocacia a participar da autuação, assinando-a e fiscalizando a legalidade de todo o ato, bem como atuar para deixar consignado no procedimento os incidentes ocorridos e julgue necessário.
Como muito bem assinalou Paulo Lôbo, 10 nesse caso, o “representante da OAB” nomeado passa a integrar a defesa do Advogado autuado, na condição de assistente, seja no inquérito policial ou na ação penal, em observância ao artigo 16 do Regulamento Geral da OAB, 11 devendo ainda adotar as medidas legais, na esfera judicial ou extrajudicial, que a situação exigir.
Analisando essa mesma questão, Carlos Henrique Soares 12 enfatiza que a necessidade do representante da OAB, no que tange à prisão do advogado no exercício profissional, é justamente para se garantir a necessária proteção jurídica doesse garantidor do cidadão, que, ao exercer o seu mister constitucional, encontrou obstáculos quase instransponíveis na concretização do livre direito de defesa do cidadão.
Por sua vez, Álvaro de Azevedo Gonzaga 13 alerta para o fato de que, logo que a diretoria da OAB seja intimada pela autoridade, não demore e nem deixe de indicar o seu representante para acompanhar a situação, pois não poderá posteriormente alegar ilegalidade do ato por conta da sua inércia ou omissão, o que poderá implicar em graves responsabilidades à diretora.
O Brasil, possuidor de um notório e vergonhoso passado descompromissado com os Direitos Humanos, além de continuar a produzir prisões ilegais – apesar da institucionalização atrasada das audiências de custódia –, também costuma constranger advogados e até prende-los em pleno exercício do seu ministério constitucional, ampliando assim os abusos de autoridade. 14 No entanto, com a edição da Lei 13.869/2019 (que dispõe sobre os crimes de abuso de autoridade), mais especificamente os seus artigos 9.º e 43, o “representante da OAB” muniu-se de mais instrumentos jurídicos para defesa eficiente das prerrogativas.
É preciso mencionar, também, que a lei dos crimes de abuso de autoridade converteu em tipo penal, isto é, tornou crimes, quatro (II, III, IV e V) dos vinte e um incisos do artigo 7.º, da Lei 8.906/1994, prevendo uma pena de 3 meses a 1 ano detenção e multa; porém, o artigo 2.º, 15 da Lei 14.365/2022, majorou a aludida sanção penal, que agora é de 2 a 4 anos de detenção e multa.
Cumpre destacar, ainda, que o “representante da OAB” intervêm no caso de busca e apreensão no escritório de advocacia, quando o advogado for investigado e demonstrada a presença da materialidade e indícios de autoria, conforme previsto no Estatuto da Advocacia, artigo 7.º, § 6.º, 16 devendo todos os atos dessa excepcional medida judicial serem cumpridos perante tal represente da ordem.
Para fortalecer essas estruturas legais protetivas da advocacia, do Advogado e, por consequência, do próprio cidadão, surge nesse ambiente a Lei 14.365 de 02 de junho de 2022 – resultado de um trabalho hercúleo e habilidoso de todos as representações dos advogados – ampliando as prerrogativas dispostas no Estatuto da Advocacia, além de dotar o valoroso e indispensável “representante da OAB” de maiores responsabilidades ao atribuir-lhe certas funções complexas na defesa das prerrogativas profissionais, previstas nos parágrafos 6.º-C ao § 6.º-H, do artigo 7.º, do EAOAB. Notese
(i) § 6.º-C: O representante da OAB referido no § 6º deste artigo tem o direito a ser respeitado pelos agentes responsáveis pelo cumprimento do mandado de busca e apreensão, sob pena de abuso de autoridade, e o dever de zelar pelo fiel cumprimento do objeto da investigação, bem como de impedir que documentos, mídias e objetos não relacionados à investigação, especialmente de outros processos do mesmo cliente ou de outros clientes que não sejam pertinentes à persecução penal, sejam analisados, fotografados, filmados, retirados ou apreendidos do escritório de advocacia.
(ii) § 6.º-D: No caso de inviabilidade técnica quanto à segregação da documentação, da mídia ou dos objetos não relacionados à investigação, em razão da sua natureza ou volume, no momento da execução da decisão judicial de apreensão ou de retirada do material, a cadeia de custódia preservará o sigilo do seu conteúdo, assegurada a presença do representante da OAB, nos termos dos §§ 6º-F e 6º-G deste artigo.
(iii) § 6.º-E: Na hipótese de inobservância do § 6º-D deste artigo pelo agente público responsável pelo cumprimento do mandado de busca e apreensão, o representante da OAB fará o relatório do fato ocorrido, com a inclusão dos nomes dos servidores, dará conhecimento à autoridade judiciária e o encaminhará à OAB para a elaboração de notícia-crime.
(iv) § 6.º-F: É garantido o direito de acompanhamento por representante da OAB e pelo profissional investigado durante a análise dos documentos e dos dispositivos de armazenamento de informação pertencentes a advogado, apreendidos ou interceptados, em todos os atos, para assegurar o cumprimento do disposto no inciso II do caput deste artigo.
(v) § 6.º-G: A autoridade responsável informará, com antecedência mínima de 24 (vinte e quatro) horas, à seccional da OAB a data, o horário e o local em que serão analisados os documentos e os equipamentos apreendidos, garantido o direito de acompanhamento, em todos os atos, pelo representante da OAB e pelo profissional investigado para assegurar o disposto no § 6º-C deste artigo.
(vi) § 6.º-H: Em casos de urgência devidamente fundamentada pelo juiz, a análise dos documentos e dos equipamentos apreendidos poderá acontecer em prazo inferior a 24 (vinte e quatro) horas, garantido o direito de acompanhamento, em todos os atos, pelo representante da OAB e pelo profissional investigado para assegurar o disposto no § 6º-C deste artigo.
Portanto, com a edição dessa lei nova e por meio de singela interpretação, conclui-se que o legislador ordinário atribuiu mais competências e complexas responsabilidades ao “representante da OAB”, o qual agora é legal e institucionalmente compelido a exercer a fiscalização e a defesa de “novas prerrogativas” advocatícias de forma muito mais qualificada, tendo em vista a natureza jurídica persecutória (colheita de índicos) presentes nas seis situações retratadas nos sobreditos parágrafos 6.º-C a 6.º-H, do artigo 7.º, da Lei 8.906/1994.
Nesse aspecto, apesar do “representante da OAB”, há muito, possuir grandes responsabilidades no desempenho de suas funções institucionais, sobremodo com relação à fiscalização e defesa das prerrogativas, após a edição da Lei 14.365/2022 essa tarefa classista está muito mais delicada, dado que se exige razoável conhecimento desse mister e, sobretudo, das formas ou procedimentos legais de atuação, demonstrando o relevante grau e complexidade de sua intervenção nesse cenário.
Agora, para além de somente fiscalizar a pratica do ato da autoridade competente – busca e apreensão, por exemplo –, o “representante da OAB” também fará relatório circunstanciado dos fatos ocorridos e sobre eventuais inobservância legais do agente público responsável, acompanhará análise documentos e de equipamentos apreendidos, fiscalizará a cadeia de custódia, assim como “impedir que documentos, mídias e objetos não relacionados à investigação, especialmente de outros processos do mesmo cliente ou de outros clientes que não sejam pertinentes à persecução penal, sejam analisados, fotografados, filmados, retirados ou apreendidos do escritório de advocacia”.
Definitivamente, ante esse novel cenário, não há como negar que estar-se falando de um “super representante da OAB”, esculpido e criado pela recém legislação (Lei 14.365/2022), especialmente para garantir a segurança jurídica do advogado investigado, dos dados dos clientes, do funcionamento e estrutura do próprio escritório profissional, bem como ampliar e fortalecer a fiscalização dos atos da investigação, evitando-se excessos, abusos e futura injustiças.
Surge, dessa forma, mais uma obrigação institucional relevantíssima para as diretorias da OAB (Conselho Federal, Seccional e Subseção), as quais devem estar organizadas material e intelectualmente com o fim de concretizar essas novas e fundamentais prerrogativas. Aliás, é uma prerrogativa do advogado ter as suas prerrogativas defendidas pela OAB, posto tratar-se de imperativa disposição legal expressa no Estatuto da Advocacia – artigos 44, inciso II, 17 54, inciso III, 18 57, 19 e 61, inciso II, 20 –, que bem delimitou as competências institucionais das mencionadas diretorias para melhor prestar aos advogados serviço primordial e qualificado: a defesa das suas prerrogativas profissionais.
No entanto, como do conhecimento meridiano, as diretorias da OAB delegam essa função vital de defesa das prerrogativas à uma comissão de trabalho especifica, denominada de “Comissão de Direitos e Prerrogativas”, como, por exemplo, na Seccional São Paulo, 21 ou de “Comissão Nacional de Defesa das Prerrogativas”, conforme adotado pelo Conselho Federal; 22 enquanto que as subseções das secionais da OAB, como regra, seguem a mesma nomenclatura que a da sua Secional.
Importante ressaltar, todavia, que nem todas as subseções da OAB possuem “Comissão de Prerrogativas” formada, estruturada e conhecida, apesar da competência legal que foi atribuída pelo estatuto (velar pela dignidade, independência e valorização da advocacia, e fazer valer as prerrogativas do advogado), e isso decorre de uma série de questões políticas internas e de interesses dos respectivos diretores, aliados à estrutura existente – ainda amadora – da própria secional na defesa das prerrogativas.
Nos casos em que não existe oficialmente Comissão de Prerrogativas, a prestação desse importantíssimo serviço institucional, bem assim as responsabilidades que decorrem de omissões, recaem exclusivamente sobre os diretores eleitos para tanto e a própria OAB, 23 haja vista que o advogado violado nas suas prerrogativas jamais pode ficar ou permanecer desassistido ou desamparado no exercício ou em razão do seu ministério advocatício constitucional.
Entretanto, somente instituir “Comissão de Prerrogativas”, em qualquer nível da OAB, não basta. É preciso ir muito mais longe e ousar para qualificar e aperfeiçoar constantemente todos os membros da comissão – que denomino “Defensor de Prerrogativas” –, promovendo ainda um curso específico de prerrogativas (teoria e pratica) e de argumentação jurídica, além de fornecer uma digna estrutura material profissionalizada: livros e artigos sobre a matéria, modelos de peças institucionais, plantão móvel vinte e quatro horas, um regimento interno, intercâmbios com comissões de outras regiões, reuniões periódicas para estudar casos concretos, analisar as atualizações legislativas e possuir uma identidade funcional própria.
Podemos afirmar que essa desejada e singela estrutura já vem sendo desenvolvida de forma oficial, inédita e muito satisfatória, sobretudo pela 104.º Subseção Itaquera 24 da Seção São Paulo da OAB. É mesmo por aí que se deve avançar e expandir os estudos, ações, prevenções e defesas de prerrogativas, uma vez que quase todos os advogados estão inscritos em alguma Subseção.
Mas a subseção, via de regra, só pode ser estruturada com a indispensável colaboração da Seccional da OAB a que pertence, pois é esta quem administrativa os recursos financeiros e o disponibiliza, sobremaneira mediante orçamento. De igual forma, também depende da seccional, por meio de sua Comissão de Direitos e Prerrogativas, a adoção de diretrizes técnicas e normativas, orientações, reuniões periódicas, disponibilização de suportes materiais e toda a estruturação institucional das regionais de defesa das prerrogativas.
Todo esse aparato institucional, que deve estar presente e disponível nos três órgãos 25 administrativos da OAB, é extremamente fundamental para se concretizar os desideratos ou os fins da instituição, especificamente com relação à defesa das prerrogativas. E, com a edição da Lei 14.365/2022, não é mais admissível se omitir ou negligenciar a prevenção e defesa qualificada das prerrogativas advocatícias.
É de todo essencial que se diga que foi a própria OAB quem trabalhou habilmente no Congresso Nacional para ver aprovada a lei em testilha e com isso ampliar as prerrogativas da advocacia, como alcançado; de modo que agora é preciso que ela fortaleça, multiplique e aperfeiçoe todas as suas estruturas operacionais preventivas e defensivas, com vistas a se construir ou produzir um “representante da OAB” (“Defensor de Prerrogativas”) capacitado o suficiente para concretizar, pacífica, legal e diplomaticamente a defesa qualificada dos advogados e da advocacia.
O “representante da OAB”, no âmbito da legislação, realmente, sofreu uma “metamorfose”, ao estilo de Kafka, 26 fortaleceu-se legalmente, está mais encorpado de substanciais responsabilidades. Só nos resta, de agora em diante, exigir que ele também esteja revestido da qualidade técnico-cultural necessária e indispensável à prevenção e defesa das prerrogativas de uma “Função Essencial à Justiça”: Advocacia.
Nesse aspecto, lembremos que, institucionalmente, o princípio constitucional da “eficiência” (CF, artigo 37, caput), 27 regente da Administração Pública em geral, também norteia os órgãos da Ordem dos Advogados do Brasil, em todos os seus níveis trabalhos, ainda que, infelizmente, alguns diretores resistam a ele, seja negligenciando ou se omitindo, ou engavetando bons projetos de prerrogativas.
Finalmente, o nobre leitor deste singelo e atrevido artigo ainda pode estar se perguntando por qual motivo optou-se por grafar sempre com aspas a expressão “representante da OAB”. É que sob a ótica do autor destas linhas, eterno estudante e aprendiz, a OAB ainda não se despertou – ao menos no que tange as prerrogativas da Advocacia – para a formação permanente e qualificada de um autêntico represente da OAB para àquelas profundas questões jurídicas, novas e antigas, a ponto de merecerlhe a exclusão das aspas
4. conclusão
Temos, pois, um novo “representante da OAB”, transformado que foi num autêntico “especialista” pela Lei 14.365/2022. E, com isso, essa nova legislação passa a exigir dessa personagem ou figura institucional uma qualificação muito diferenciada, isto é, mais aperfeiçoada e, inclusive, interdisciplinar, para fiscalizar amplamente os atos da autoridade competente, norteando-se sempre pela legalidade, argumentação eficiente, diplomacia e pacificidade.
O atual cenário de absurdas violações de prerrogativas advocatícias, ademais, não admite mais o amadorismo e o baixo preparo da OAB na defesa dessas vitais prerrogativas. A advocacia e o Advogado exigem atuação e proteção mais qualificadas.
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