(artigo publicado no “site” www.migalhas.com.br em 1.º-09-2005)
Edson Pereira Belo da Silva
Advogado em São Paulo e pós-graduado em Direito
Excelente
seria que inexistisse qualquer tipo de violência, sobremaneira
àquela perpetrada contra a pessoa. Também seria ótimo
que não existissem armas para facilitar a prática ou a
execução de qualquer modalidade de violência. A
violência – tanto como forma de ataque ou como forma defesa
– sempre existiu, é ela própria do gênero
animal, de maneira que é impossível exterminá-la.
Destarte, podemos atenuá-la de tal forma que as pessoas se sintam
mais seguras.
O grande problema a ser enfrentado chama-se: “insegurança pública”. A insegurança tornou-se uma constante em nossa sociedade, ninguém se sente mais seguro, nem mesmo dentro do seu próprio lar; o medo tomou conta da sociedade. Aqueles que possuem recursos investem em sua própria segurança (ofendículas, cães, seguranças, carro blindado, etc.), ao passo que os que sofrem com a carência de recursos defendem-se como pode ou não se defendem, simplesmente por causa da completa ausência de forças para reagir.
Todos nós sabemos os motivos que levaram à crescente e assustadora onda de violência em nosso país, os quais, em princípio, derivam dos nossos problemas sociais, que, há muito, são expostos pela mídia diariamente. Mas o enfrentamento dessa violência que está aproximando-nos cada vez mais do caos nunca foi satisfatório, ou seja, não trouxe o resultado esperado pela sociedade, mesmo com a criação de leis penais mais rígidas.
Essa falta de confiabilidade nas ações ou atuações do Poder Público frente à segurança pública levou as pessoas a buscarem os meios de defesa mais práticos e de menor esforço para conter a violência contra si, contra terceiro e contra a propriedade ou o patrimônio. Resulta daí a compra de armas de fogo, por vezes indiscriminada ou desprovida dos cuidados necessário. Isso acontece bastante e, sobretudo, com aqueles que adquirem determinado tipo armamento para guardarem suas residência ou o seu comércio.
Quando o cidadão de bem resolve se armar é porque, na prática, o Estado não vem preservando ou não consegue preservar, sobremodo, os princípios fundamentais, as garantias e os direitos sociais básicos esculpidos na Constituição Federal, artigos 3.º, inciso III, 5.º, e 6.º, ou seja: (i) não consegue erradicar a pobreza, a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; (ii) não lhe protege a vida; (iii) de igual forma o direito de locomoção; (iv) e, muito menos, lhe ajuda a proteger a sua propriedade e seus bens. Em suma, o direito à segurança, tido como preceito fundamental, apenas permanece no papel, assim como outros direitos.
As pessoas não podem esperar, eternamente, pela eficiência do poder estatal no cumprimento de suas obrigações legais, ou, ainda, pelo momento em que este, efetivamente, resolva assumir de uma vez por todas o seu papel. Se essas pessoas possuem um manancial de direitos e o Estado sequer consegue proteger o mais substancial de todos, a vida, elas – imbuídas de um instinto ou princípio natural – tentaram se proteger, nos termos da lei ou de acordo com as suas condições, suprindo a inércia do Poder Público.
Conforme já assinalamos, a arma é o instrumento mais eficaz, seguro e acessível para que qualquer pessoa possa exercer a legitima defesa de sua vida ou de terceiro, ou, ainda, de sua propriedade ou bens. De sorte, que qualquer norma que proíba a aquisição ou porte de arma de fogo que atenda o regulamento legal específico, tira da pessoa a possibilidade de proteger os mencionados bens jurídicos, deixando-a duplamente desprotegida, pois é muito difícil poder contar com a efetividade ou presença do Estado.
Como visto, ao ser impedida de portar ou guardar em seu lar uma arma de fogo a pessoa tem dificultado a proteção dos seus bens, em especial a vida. E quando isso acontece ocorre uma patente violação a um direito constitucional, resultando, portanto, na inconstitucionalidade de qualquer intenção normativa ou norma especifica tendente a vedar à aquisição e o porte de arma de fogo para os citados fins.
Por sua vez, a proibição no sentido aqui exposto – consoante dispõe a Lei n.º 10.826/03 – torna mais confortável ou menos perigoso às empreitadas criminosas, não encontrando os malfeitores resistência efetiva, de suas vítimas, e na mesma proporção, as quais, mais do que nunca, indefesas e desprotegidas, pois o Poder Público continuará inerte à sua missão constitucional.
Não estamos defendendo interesses da indústria bélica, senão os princípios basilares de toda e qualquer pessoa previstos em lei.
É muito difícil ter que sustentar essa tese, pois, certamente, a sociedade tem pavor não só à arma de fogo, mas a tudo aquilo que pode ocasionar risco ou tirar a vida de um ser humano injustamente, sem motivo ou razão. Entretanto, as pessoas não podem permanecer completamente vulneráveis àqueles que praticam violência e que, por vezes, têm nela o principal elemento de sua “profissão”: o crime.
Quanto às pesquisas divulgadas pelos especialistas em segurança pública, as quais apontam para um grau de violência maior quando o infrator da lei percebe que a vítima está armada ou oferece resistência ao ato violento e criminoso, por si só, não é um indicador de que as pessoas não possam guardar, possuir ou portar arma de fogo. Por outro lado, não se tem notícia de pesquisa demonstrando que a posse ou porte de arma de fogo pode inibir a atividade dos criminosos, quando tudo indica que isso seja provável.
Com efeito, a Emenda II de 1791, da Constituição do Estados Unidos da América, garante ao povo a posse e o porte de arma de fogo e talvez por isso o índice de violência, em geral, neste país seja inferior ao do nosso. Ressalte-se, que não estamos buscando promover o armamento indiscriminado ou não da população. Não é essa a solução. Como também não o é a proibição de possuir ou portar armas de fogo. A questão é muito mais complexa.
Portanto, proibir que alguém possua ou porte uma arma de fogo – instrumento eficaz, seguro e acessível – para a sua segurança pessoal ou de sua família, ou, ainda, de sua propriedade ou bens, tudo diante da total inércia do Estado contra a criminalidade crescente, é deixá-lo mais vulnerável e humilhado às investidas dos criminosos ou dos agressores, violando o sagrado e consagrado direito de defender a integridade física sua e de terceiro e, por conseguinte, a vida.
As condições impostas pela nova lei de armas, dispostas no artigo 4.º, são exageradas, sobretudo as taxas exigidas para registro, renovação, expedição de porte, etc., que vão de R$ 300,00 a R$1.000,00. Tais exigências objetivas e subjetivas, aliadas as elevadas taxas, sepultam qualquer iniciativa de um cidadão, que necessita proteger a si, sua família e patrimônio, de possuir ou portar uma arma de fogo, uma vez que necessitará de quase o dobro do valor despendido para aquisição do armamento liberado pela norma regulamentar.
Ora, todos nós sabemos que a maior parte da população não consegue sobreviver, dignamente, com os seus parcos rendimentos, além do endividamento pessoal de cada um, de maneira que não terá como atender todas as exigências legais para obter uma arma de fogo, tornando, assim, inócua a autorização prevista na lei de regência quanto à possibilidade de se possuir legalmente uma arma de fogo.
Alias,
mais uma vez a lei privilegia aqueles que possuem recursos financeiros
em detrimento da camada mais pobre da sociedade, a grande maioria.
Não obstante, o desarmamento e a quase impossibilidade de se
ter uma arma deixa indefesa ou vulnerável toda uma sociedade,
que não poderá repelir injusta agressão até
mesmo do próprio Estado ou dos seus órgãos constituídos.
Essa também não será uma das pretensões
do poder estatal? Eis aí uma questão para refletir.
Para se possuir ou portar uma arma de fogo é indispensável, obviamente, que a pessoa interessada atenda alguns requisitos básicos, como, por exemplo, ter bons antecedentes, aptidão psicológica e capacidade técnica, disso não há como divergir; o que não se pode é obstar o exercício de tal direito com inúmeras condições.
A legitima defesa é um direito de todos e não só dos privilegiados que conseguem atender todas as condições legais para possuir ou porta arma.
Os peritos em matéria de segurança pregam para que ninguém reaja a um assalto, por exemplo, mesmo que armada; todavia, quantas pessoas que, armadas ou não, foram mortas, postas em cadeiras de rodas, abatidas como uma ave, etc., que gostariam de ter reagido de alguma forma e não tiveram essa oportunidade, talvez estivessem vivas e gozando de todas as suas faculdades físicas.
Assinale,
finalmente, que, em regra, a arma de fogo coloca a suposta vítima
em igualdade de condições para com o ofensor, quando não
provoca uma superioridade de armas, devendo a referida vítima
tomar muito cuidado com o excesso no momento da exercer a defesa legitima.
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